Adolfo Fetter Júnior

Dialética marxista não trouxe o esperado, mas seus seguidores insistem...

Adolfo Fetter Júnior
Ex-deputado federal e ex-prefeito de Pelotas
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Uma coluna em jornal não é o espaço ideal para debates ideológicos profundos, mas, provocado e citado nominalmente em artigo publicado no Diário (6/9), não posso me furtar a alguns comentários, mesmo que de forma sintética.

Há uma contradição evidente entre o discurso e a prática do atual governo federal. A sistemática do "toma lá, dá cá" não tem como ser relativizada, por ser de conhecimento geral e estar a cada dia estampada na mídia, seja na liberação bilionária de emendas (até do antes tão questionado Orçamento Secreto, agora rebatizado) e na permanente busca de cooptação de parlamentares (com a oferta de cargos em ministérios e estatais), tudo em nome da "governabilidade" que não foi obtida nas eleições para o Congresso Nacional.

Ora, a dita esquerda elegeu perto de 25% dos deputados federais e menos do que isto no terço dos senadores em 2022, mas o Luciano Lima continua atacando o "Centrão" e cita nominalmente o PP (que o presidente Lula tenta dividir ao anunciar a nomeação de um deputado do Maranhão para ministro dos Esportes, em substituição a uma mulher lésbica que estava ocupando esta pasta). Há alguma coerência nisto, com o discurso reiterado?

Em outro parágrafo, ao abordar o mote "nós contra eles", busca justificar a polarização que continua desde as eleições presidenciais passadas (vitória de apenas 2% do total, ou seja, de 51% a 49%), com base na dialética marxista da luta de classes, que refletia a realidade do século 19 e que já foi superada até na antiga e esfacelada União Soviética (ou na Rússia belicista que dela sobrou).

Aliás, hoje só acreditam na "ditadura do proletariado" os regimes mais fechados, brutais e atrasados em algumas partes da América Latina e da Ásia. Mesmo o gigante chinês adotou a linha do Deng Xiaoping desde que ele sucedeu ao Mao na década de 1970, repetindo antigo provérbio inglês de que "não importa a cor do gato, desde que ele cace o rato", para justificar a abertura econômica para empresas privadas e para o comércio global.

Para tentar comprovar sua crença, apela para o argumento dos "1% mais ricos contra os 99% mais pobres" que comprova as desigualdades existentes em nível global, mas que não faz o menor sentido no dia a dia das nossas vidas cotidianas aqui (onde a maioria da população se considera como "classe média", o que o próprio Lula estimula ao defender a picanha e a cervejinha a que todos teríamos direito). Curioso é que na crise de 2014 o secretário de Política Econômica da ex-presidente Dilma disse que, se não tivesse carne, que se comesse ovos...

A realidade é muito mais complexa do que esta simplificação maniqueísta - e uma vez mais contraditória - para um governo que tenta ajudar a indústria automobilística com subsídios a ditos "carros populares" (de até R$ 130 mil), ou que propõe um Arcabouço Fiscal que exigirá aumento na tributação de todos para subsidiar um crescimento muito elevado nas despesas, bem como uma Reforma Tributária que contraria "cláusula pétrea" da Constituição, ao retirar autonomia e competência dos entes federados, que passam a depender de Brasília para arrecadar tributos que hoje lhes são exclusivos. Em suma: mais governo e menos povo; mais Brasília e menos Estados e Municípios.

Mais adiante apela que há uma "retórica oportunista" que cria "falsas polarizações" com base em questões de costumes, ou de disseminação de "ódio religioso, racial, ideológico...". Curioso é que aí cabe tudo que lhe parece inconveniente ou contrário à sua própria ideologia, em temas que sabidamente o eleitorado brasileiro é majoritariamente conservador, como aborto, legalização de armas, drogas e propriedade privada.

Ao concluir afirma que "... a polarização não é o maniqueísmo do bem contra o mal" e considera 99% do povo como sendo "nós", como se fosse apenas um combate contra os 1% mais ricos.

Para contrapor vou destacar artigo recente do cardeal dom Jacinto Bergmann (Verdade e Violência, de 2/9), que argumenta que não se pode "relativizar" a verdade, pois os totalitarismos modernos que "... substituindo a verdade pelas mentiras da ideologia, levaram às barbáries do século 20".


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